segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Projeto de desenvolvimento conjunto e soberano é caminho para Amazônia

Construir um projeto conjunto de desenvolvimento soberano para a Amazônia é essencial para o futuro da região e do país. O caminho passa por integrar economias, regularizar a posse da terra, fazer inclusão social, criar conhecimento, defender as riquezas, a biodiversidade e os direitos tradicionais.

Em torno dessas ideias, especialistas de diversas áreas se reuniram na semana passada em Manaus. Economistas, diplomatas, advogados, militares, ecologistas debateram propostas para a região no 3º Congresso Internacional do Centro Celso Furtado, com o tema Amazônia Brasileira e Pan-Amazônia: Riqueza, Diversidade e Desenvolvimento Humano.

Congregando oito países, 7,5 milhões de km², 40 milhões de habitantes e 20% da água doce que corre para os oceanos, tudo é superlativo na região. Maior bacia hidrográfica do mundo, maior floresta, na região se encontram 70% das fronteiras do Brasil. Sempre vista como objeto de cobiça externa, sua internacionalização foi debatida no século 20.

Com a oposição das Forças Armadas, essa proposta foi engavetada. A ocupação, na parte brasileira, deslanchou a partir do período ditatorial, com projetos de estradas, como a Transamazônica, e exploração por grandes empresas que receberam incentivos para produzir –e desmatar.

Na transição para a democracia, a ligação com os países da região foi aumentando. O Mercosul foi criado em 1991. A Alca, associação com os EUA, foi rechaçada. Em 2000, os presidentes da América do Sul fizeram sua primeira reunião conjunta sem a presença de outras potências. Surgiu o embrião da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), constituída oficialmente em 2008.

"A criação da Unasul é um negócio gravíssimo para os EUA", diz o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, ex-ministro-chefe de assuntos estratégicos do Brasil. Ele avalia que os norte-americanos não gostaram da formação de uma união no continente sem a sua anuência. "De repente se criou um organismo sul-americano com a capacidade de resolver conflitos, com a ação do Brasil, que sempre se pautou pela autodeterminação dos povos e pela não intervenção", afirma.

Pedro Silva Barros, diretor de assuntos econômicos da Unasul fala da necessidade de avanços na integração da região. Lembra, por exemplo, que o Brasil é um grande consumidor de fertilizantes, especialmente para as plantações de soja do Mato Grosso. O NPK usado nas lavouras é importado de países como Rússia, Ucrânia, Egito e Marrocos, gerando um deficit anual de US$ 10 bilhões. No entanto, países vizinhos do Brasil têm todos os elementos para a produção de fertilizantes.

"A Venezuela é grande produtora de ureia, a Bolívia detém as maiores reservas mundiais de lítio –e, como derivado da produção de lítio para as baterias, tem o reservas de potássio–; o Peru tem reservas de fosfato. Os três não têm integração produtiva, têm deficiência de integração fluvial. O mercado por si, nessas muitas décadas, não fez essa integração. É necessário um planejamento conjunto da região", advoga.

Para ele, é possível também ter um planejamento energético de forma integrada com os países da América do Sul. "Na Europa e na Ásia houve sucesso na integração energética, essencial em momentos de instabilidade, e que coloca questões de longo prazo acima de detalhes de política interna".

Ennio Candotti, ex-presidente da SBPC, Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, e diretor do Museu da Amazônia, alerta sobre problemas na Zona Franca de Manaus. Critica o fato de o poder decisório das empresas ali instaladas não estar na região e de não haver maior preocupação com o desenvolvimento tecnológico.

Concordando com a avaliação do cientista, Barros declara: "As empresas estão fazendo o seu jogo. A política de indução do Estado é válida, mas pode ser aprimorada, obrigando que as companhias tenham maior produção de ciência e tecnologia aqui e uma maior articulação com os países vizinhos".

Outro ponto debatido foi o do direito de patente dos produtos da região que são conseguidos fora da Amazônia. Barros lembrou que o Equador aprovou legislação que desconhece as patentes de produtos da região obtidas fora do pai. "Isso poderia ser discutido entre os países", sugere.

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