quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Blindagem de juízes e togas voadoras


Togas voadoras
Por Frederico Vasconcelos - Folha de SP
Começou mal o novo corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, ao dizer, em discurso de posse, que “o papel primordial (do CNJ) é de proteger, é de blindar a magistratura das influências externas, fazer com que o juiz exerça a magistratura na mais plena liberdade, fazer com que juiz não tenha medo da mídia, mídia que se tornou um poder”, segundo revelou a Folha, na edição desta quinta-feira (25).

Não foram influências externas que motivaram, em fevereiro deste ano, um diálogo inusitado numa sessão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, o tribunal da cidadania.

“Esse presidente é um tremendo mau-caráter”, disse Noronha, naquela ocasião, referindo-se ao presidente da Corte, ministro Francisco Falcão.

Falcão, gritando, respondeu: “Mau-caráter é Vossa Excelência, me respeite!”

Segundo a Folha revelou, a discussão começou quando Falcão afirmou que “o STJ, num fato inédito, devolveu aos cofres públicos da União R$ 34 milhões do Orçamento de 2015 […]. Fizemos muito, com pouco. É um fato inusitado na administração pública brasileira”, afirmou.

Em seguida, ele lembrou ter suspendido a construção de um edifício que seria usado pela Escola de Nacional de Formadores e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), de acordo com o presidente, no valor de R$ 40 milhões.

Noronha, que já foi diretor-geral do Enfam, interrompeu Falcão e o acusou de gastar recursos desnecessariamente, comprando veículos novos para o Tribunal.

Falcão argumentou que tais aquisições atendiam a um pedido do próprio Noronha, que se revoltou com a afirmação: “Mentira! É tão mentiroso […]. Um mau-caráter desse vem me provocar em sessão”, disse ele, dirigindo-se a Falcão.

Na última segunda-feira, a Folha publicou reportagem revelando que, nos dois anos em que presidiu o STJ, Falcão esteve ausente da Corte em viagens oficiais que totalizam quatro meses e meio fora do gabinete. O período corresponde à soma dos dias em que visitou dez países, alguns deles mais de uma vez, e, em menor escala, a viagens feitas no Brasil.

Segundo a reportagem, o presidente às vezes regressava das viagens externas, participava da reunião quinzenal da Corte Especial, às quarta-feiras, e seguia para a Praia do Paiva, na região metropolitana do Recife, onde possui um imóvel.

Quando foi corregedor nacional de Justiça e, recentemente, esteve na presidência do Conselho da Justiça Federal, Falcão tentou controlar o afastamento de magistrados para ir a eventos no exterior, sob alegação de economia e risco de prejuízo para o andamento dos trabalhos.

Em outubro de 2012, a Folha também divulgou que ministros do STJ viajariam à Alemanha, em primeira classe e com diárias antecipadas em dólar, para um evento sob o abrigo de programa de intercâmbio criado em 2010 pela Corregedoria da Justiça Federal na gestão de Falcão.

Seu sucessor, Noronha, disponibilizou dez vagas para sócios da Ajufe (Associação de Juízes Federais do Brasil), mas que pagariam do bolso suas despesas. Alguns magistrados viram a extensão do convite aos juízes como forma de diluir a imagem de um tour internacional com recursos públicos e limitada troca de conhecimento científico.

A gestão que se encerra no CNJ deixou de levar a julgamento vários processos graves contra magistrados. Descumpriu o regimento interno, que estipula prazos e prioridade para serem levados a julgamento liminares e pedidos de vista.

Aparentemente, o Conselho já vinha blindando a magistratura muito antes da posse do novo corregedor.

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